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Com o avanço da variante Ômicron e o número de casos aumentando em grande velocidade, uma das atualizações que ganhou destaque foi em relação aos períodos de isolamento de casos positivos e contactantes.
O Center for Disease Control and Prevention (CDC) mudou suas recomendações, o que vem causando polêmica internacionalmente. Segundo comunicado oficial, as decisões foram baseadas em evidências que mostram que o maior risco de transmissão seria nos dias iniciais de doença, diminuindo com o passar do tempo, e considerando potenciais dificuldades e malefícios psicológicos.
Em consonância com os períodos mais curtos estabelecidos pelo CDC, outros órgãos regulatórios e de controle de diversos locais também alteraram seus consensos. Entretanto, a possibilidade de que a interrupção precoce do isolamento seja um fator para perpetuação de transmissão é um dos pontos de crítica às atualizações.
Saiba mais: Ministério da Saúde reduz isolamento para sete dias em casos leves de Covid-19
Vamos entender um pouco mais sobre essas recomendações e as evidências em que estão baseadas.
Quais os novos períodos de isolamento?
Por meio de documentos diferentes, o CDC alterou suas recomendações para indivíduos da população geral com infecção confirmada e com exposição ao SARS-CoV-2, além de profissionais de saúde. O status vacinal é levado em conta, classificando indivíduos em não-vacinados e em vacinados com ou sem booster, assim como o tempo da última dose para os que não receberam booster. Pessoas com esquemas incompletos são considerados como não-vacinados. Além de medidas de isolamento, as novas recomendações reforçam a necessidade de completar o esquema vacinal e do uso adequado de máscara.
Para os indivíduos da população geral que foram contatos próximos de um caso confirmado de Covid-19, as recomendações do CDC em relação ao período de quarentena estão resumidas na tabela a seguir:
Status vacinal | Período de quarentena |
Não vacinados OU Vacinados com Pfizer/Moderna há mais de seis meses e sem booster OU Vacinados com Janssen há mais de dois meses e sem booster |
|
Vacinados com dose de booster OU Vacinados com Pfizer/Moderna há menos de seis meses Vacinados com Janssen há menos de dois meses |
|
Pessoas expostas e com infecção confirmada por SARS-CoV-2 nos últimos 90 dias (teste viral positivo) | Sem necessidade de fazer quarentena, exceto se desenvolvimento de sintomas |
Todos os contatos com um caso positivo devem, independente do status vacinal, monitorar o desenvolvimento de sintomas até o décimo dia após o último contato com caso positivo e, se houver desenvolvimento de sintomas, isolar-se imediatamente e realizar testagem, permanecendo em isolamento até resultados.
Para os indivíduos com infecção confirmada, o CDC recomenda, independente do status vacinal, cinco dias de isolamento domiciliar. Para o término do isolamento, as recomendações são baseadas no quadro clínico.
Quadro clínico | Recomendação de tempo de isolamento |
Assintomático | Término do isolamento cinco dias após o teste positivo |
Com sintomas leves | Término do isolamento se sintomas em melhora e com pelo menos 24h sem febre e sem uso de antitérmicos |
Com sintomas graves | Isolamento de pelo menos dez dias |
Para todos, contatos e casos confirmados, independente do status vacinal, os seguintes cuidados devem ser tomados até completar dez dias:
- Uso de máscara por todo o período de dez dias quando próximo a outras pessoas;
- Evitar viagens;
- Evitar contato com pessoas consideradas de risco.
Os profissionais de saúde possuem recomendações próprias, que levam em consideração a possibilidade de escassez de recursos humanos para atendimento pela quantidade de profissionais afastados.
Além das condições de força de trabalho, o CDC considera o status vacinal para orientar o afastamento de profissionais de saúde expostos ou com diagnóstico confirmado de Covid-19.
Profissionais com diagnóstico de Covid-19 | |||
Status vacinal | Situação convencional | Situação de contingência de profissionais | Situação de crise de profissionais |
Vacinados, vacinados com booster e não vacinados | dez dias OU sete dias com teste de controle negativo, se assintomático ou com sintomas leves em melhora | cinco dias com ou sem teste de controle negativo, se assintomático ou com sintomas leves em melhora | Sem restrições de trabalho, considerando priorização (assintomáticos ou sintomáticos leves) |
Profissionais com exposição a caso positivo e assintomáticos | |||
Status vacinal | Situação convencional | Situação de contingência de profissionais | Situação de crise de profissionais |
Vacinados com booster | Sem restrições de trabalho, com testes negativos nos dias 2 e 5-7 | Sem restrições de trabalho | Sem restrições de trabalho |
Vacinados sem booster ou não vacinados, mesmo com história de infecção nos últimos 90 dias | dez dias OU sete dias com teste de controle negativo | Sem restrições de trabalho, com testes negativos nos dias 1, 2, 3 e 5-7 | Sem restrições de trabalho (testagem se possível) |
Evidências que favorecem a redução
Para alterar os períodos de isolamento e quarentena recomendados, o CDC baseou-se em estudos que avaliaram o período de transmissibilidade, a eficiência da vacinação e nos efeitos da pandemia sobre a saúde mental.
Um dos destaques é para uma revisão de 113 estudos, abrangendo 17 países, que mostrou que a transmissão do SARS-CoV-2 ocorre prioritariamente nos primeiros dias de infecção. O pico de transmissibilidade começaria um dia antes do início dos sintomas, reduzindo em uma semana. O período médio de risco de transmissão de dois a três dias antes e até oito dias após o início dos sintomas. Essas evidências derivam de estudos de mensuração da carga viral em amostras de trato respiratório superior. No geral, não houve diferença na carga viral de indivíduos sintomáticos ou assintomáticos.
Nessa mesma revisão, foram incluídos estudos que utilizaram cultura viral para avaliar viabilidade dos vírus detectados nas amostras de indivíduos positivos assintomáticos e sintomáticos. Em um deles, vírus viáveis foram recuperados de seis dias antes a nove dias depois do início dos sintomas, quando somente sintomas típicos foram considerados. Em outros dois, não houve detecção de vírus viável em amostras coletadas após oito dias do início dos sintomas.
De forma semelhante, estudos epidemiológicos não detectaram infecções secundárias quando a exposição ao caso índice ocorreu após o quinto dia de sintoma. A transmissibilidade parece ser mais importante no período pré-sintomático e nos primeiros dias de sintomas.
Evidências que falam contra a redução
Apesar das evidências apresentadas nos estudos previamente citados sugerirem que o principal período de transmissão ocorra na fase pré-sintomática e nos primeiros dias de sintomas, outros estudos apontam que uma proporção razoável de indivíduos pode permanecer transmitindo vírus por períodos mais prolongados.
Um estudo de um grupo brasileiro da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) também encontrou evidências de períodos mais prolongados de transmissibilidade. Amostras seriadas de RT-PCR de indivíduos imunocompetentes com sintomas leves foram coletadas até negativação. Nos dias 14, 21 e 30 após o início dos sintomas, 71,33% (759/1064), 43,89% (467/1064) e 15,78% (168/1064), respectivamente, dos voluntários apresentaram testes com RT-PCR positivos.
Desses pacientes com testes persistentemente positivos, 51 tiveram amostras de nasofaringe submetidas à cultura viral celular, sendo que, das 72 amostras, 68 foram coletadas após 14 dias do início dos sintomas. Das últimas, vírus viáveis foram recuperados em 34,38%, o que correspondeu a 27,45% dos 51 pacientes. Extrapolando essa porcentagem para a proporção com exames positivos, se poderia esperar que 19,58% das pessoas positivas ainda seriam infectantes 14 dias após o início dos sintomas.
Um estudo britânico, ainda publicado somente como pré-print no repositório medRxiv, que avaliou o uso de teste de antígeno como estratégia para redução do tempo de isolamento de indivíduos positivos, encontrou que 31% e 16% das pessoas ainda podiam ser consideradas infectantes com cinco e sete dias de doença, respectivamente. Por modelagem matemática, em um cenário em que o período de isolamento é de sete dias, estima-se que 15,8% dos indivíduos seriam liberados ainda com capacidade de transmitir o vírus. Para um período de dez dias de isolamento ou de sete dias com um teste de controle negativo, essa proporção cairia para 9,2%.
Como fica a transmissibilidade diante da Ômicron?
Ainda existem muitos poucos estudos sobre o impacto da variante Ômicron. Sabe-se que é uma variante altamente transmissível e que parece ter um período de incubação mais curto, de dois a quatro dias. Entretanto, ainda é desconhecido se há alteração no período de transmissibilidade.
Um relatório preliminar de vigilância no Japão avaliou a detecção de RNA e de isolamento viral em casos sintomáticos e assintomáticos de infecção pela variante Ômicron. Foram testadas 83 amostras de 21 pacientes (19 vacinados e dois não vacinados; quatro assintomáticos e 17 sintomáticos leves). Os autores encontraram maior quantidade de RNA viral nas amostras de três a seis dias após diagnóstico ou início dos sintomas, com redução gradual nos dias subsequentes. O isolamento viral apresentou tendência semelhante, com nenhuma amostra coletada após dez dias com detecção de vírus viável.
Os achados publicados podem ser resumidos nas tabelas a seguir, adaptadas do artigo original:
Dias do diagnóstico | Amostras positivas com RNA viral | Amostras positivas com isolamento viral | Isolamento viral em amostras positivas com RNA viral |
0 – 2 dias | 20/21 (95,2%) | 2/21 (9,5%) | 2/20 (10,0%) |
3 – 6 dias | 14/17 (82,4%) | 7/17 (41,2%) | 7/14 (50,0%) |
7 – 9 dias | 17/18 (94,4%) | 2/18 (11,1%) | 2/17 (11,8%) |
10 – 13 dias | 4/15 (26,7%) | 0/15 (0) | 0/4 (0%) |
Após 14 dias | 5/12 (41,7%) | 0/12 (0) | 0/5 (0%) |
Analisando-se separadamente os casos sintomáticos e assintomáticos:
Casos sintomáticos | |||
Dias do diagnóstico | Amostras positivas com RNA viral | Amostras positivas com isolamento viral | Isolamento viral em amostras positivas com RNA viral |
1 – 2 dias | 15/16 (93,8%) | 2/16 (12,5%) | 2/15 (13,3%) |
3 – 6 dias | 8/8 (100%) | 4/8 (50,0%) | 4/8 (50,0%) |
7 – 9 dias | 16/16 (100%) | 3/16 (18,8%) | 3/16 (18,8%) |
10 – 13 dias | 7/12 (58,3%) | 0/12 (0%) | 0/7 (0%) |
Após 14 dias | 4/10 (40,0%) | 0/10 (0%) | 0/4 (0%) |
Casos assintomáticos | |||
Dias do diagnóstico | Amostras positivas com RNA viral | Amostras positivas com isolamento viral | Isolamento viral em amostras positivas com RNA viral |
0 – 5 dias | 6/6 (100%) | 3/6 (50,0%) | 3/6 (50,0%) |
6 – 9 dias | 3/4 (75,0%) | 0/4 (0%) | 0/3 (0%) |
Após 10 dias | 1/10 (10%) | 0/10 (0%) | 0/1 (0%) |
Autora:
Infectologista pelo Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (UFRJ) ⦁ Graduação em Medicina na Universidade Federal do Rio de Janeiro
Referências bibliográficas:
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- CDC. What We Know About Quarantine and Isolation. Disponível em: https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/if-you-are-sick/quarantine-isolation-background.html
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